O tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, enfrenta uma crise que pode comprometer sua delação premiada após a revista Veja revelar, em 12 de junho de 2025, que ele mentiu ao Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o uso de redes sociais para discutir detalhes de sua colaboração com a Polícia Federal (PF). Durante interrogatório no STF em 9 de junho, Cid negou ter utilizado um perfil no Instagram, identificado como
@gabrielar702, para comentar os bastidores de sua delação, apesar de evidências obtidas pela Veja mostrarem mais de 200 mensagens trocadas entre janeiro e março de 2024, período em que ele estava proibido de usar redes sociais e de revelar informações do acordo. As mensagens, que incluem críticas ao ministro Alexandre de Moraes e alegações de manipulação por parte da PF, expõem contradições que levantam dúvidas sobre a credibilidade do delator e alimentam pedidos para a anulação de sua delação.
No depoimento ao STF, presidido por Moraes, Cid foi questionado pelo advogado de Bolsonaro, Celso Vilardi, sobre o uso do perfil
@gabrielar702, que supostamente pertence à sua esposa, Gabriela. O militar hesitou, afirmando não se lembrar do perfil e negando comunicações em redes sociais, uma afirmação desmentida pelas mensagens publicadas pela Veja. Nos diálogos, Cid descreve pressões sofridas durante a delação, incluindo tentativas do delegado responsável pelo inquérito de “conduzir” suas declarações, e critica Moraes, a quem chama de “cão de ataque” e “grande pensador Netflix”, sugerindo que o ministro já teria decidido condenar réus antes do julgamento. Essas revelações, feitas em um período em que Cid usava tornozeleira eletrônica e estava sob restrições judiciais, violam diretamente os termos de sua delação, homologada por Moraes em setembro de 2023.
As contradições de Cid não se limitam às mensagens. Durante o interrogatório, ele repetiu frases como “não me lembro” e “não me recordo” dezenas de vezes, especialmente ao ser questionado sobre detalhes de reuniões e minutas golpistas, como a que previa a prisão de autoridades, incluindo o próprio Moraes. A Veja destaca que Cid tentou amenizar acusações contra Bolsonaro, negando participação direta do ex-presidente nos atos de 8 de janeiro de 2023, apesar de confirmar em sua delação que Bolsonaro revisou uma minuta para decretar estado de defesa. Essa postura hesitante, combinada com lapsos de memória, abriu flancos para defesas de outros réus, como o general Walter Braga Netto, que acusou Cid de mentir sobre a entrega de dinheiro em uma caixa de vinho para financiar ações golpistas.
A possibilidade de anulação da delação depende de uma avaliação do STF sobre a gravidade das violações. A legislação prevê que omissões, mentiras ou descumprimento das condições do acordo, como o sigilo e a proibição de contato com investigados, podem levar à perda de benefícios, como a redução de pena. A Veja aponta que as mensagens, que incluem áudios e selfies, reforçam a tese de um “jogo duplo” de Cid, que colaborava com a PF enquanto compartilhava versões conflitantes com terceiros. A defesa de Bolsonaro, liderada por Vilardi, já pediu a nulidade do acordo, argumentando “vícios insanáveis” nas declarações do delator. O pastor Silas Malafaia, aliado de Bolsonaro, também questionou a validade da delação, chamando-a de “farsa” e sugerindo que as prisões baseadas nela, como a do ex-ministro Gilson Machado, são “perseguição política”. No entanto, a Veja e outros analistas, como Matheus Leitão, alertam que a anulação da delação não necessariamente desmonta a investigação, que conta com outras provas, como minutas golpistas encontradas com Anderson Torres e gravações de reuniões.
O STF, sob relatoria de Moraes, determinou que a Meta, dona do Instagram, forneça em 24 horas os dados do perfil
@gabrielar702 para apurar sua titularidade. A defesa de Cid insiste que o perfil não pertence ao militar e pediu uma investigação, classificando as mensagens como “fake news”. Enquanto o desfecho permanece incerto, as revelações da Veja intensificam o debate sobre a confiabilidade de delações premiadas e a necessidade de rigor na condução de investigações que afetam a estabilidade institucional do país.