Milhares de pessoas tomaram as ruas de Belfast, capital da Irlanda do Norte, em uma manifestação impressionante contra a imigração em massa, realizada na última sexta-feira, 28 de março de 2025. O que tornou o evento particularmente notável foi a participação conjunta de católicos e protestantes, comunidades historicamente divididas por décadas de tensões sectárias conhecidas como “The Troubles”. Essa união rara tem sido vista por muitos como um sinal evidente de descontentamento generalizado com as políticas do governo britânico e local, responsáveis pela administração da região.
A marcha, que atravessou áreas centrais como Donegall Square e Shankill Road, reuniu uma mistura de bandeiras irlandesas e da Union Jack, símbolos tradicionalmente opostos, refletindo a diversidade dos manifestantes. Organizadores estimam que cerca de 10 mil pessoas participaram, embora a Polícia da Irlanda do Norte (PSNI) ainda não tenha divulgado números oficiais. O protesto foi pacífico na maior parte do tempo, com cânticos pedindo “fronteiras seguras” e “prioridade aos cidadãos”, mas houve registros de pequenos confrontos com contramanifestantes em áreas próximas à Universidade Queen’s.
O estopim para o movimento foi o aumento significativo de imigrantes chegando à Irlanda do Norte nos últimos anos, muitos atravessando a fronteira com a República da Irlanda ou desembarcando diretamente por rotas marítimas. Dados do Northern Ireland Statistics and Research Agency (NISRA) indicam que a população nascida fora do Reino Unido na região cresceu de 4,5% em 2011 para 7,8% em 2024, um salto que, embora modesto em termos globais, gerou preocupações locais sobre habitação, empregos e serviços públicos. A política migratória do Reino Unido, combinada com a porosidade da fronteira pós-Brexit, tem sido apontada como um ponto de falha por líderes comunitários de ambos os lados.
Irlandeses e britânicos que acompanharam o evento destacaram a raridade dessa aliança. Um comerciante de Falls Road, área predominantemente católica, comentou ao jornal Belfast Telegraph: “Nunca vi nada assim em 50 anos. Se católicos e protestantes estão marchando juntos, é porque o governo perdeu o controle.” Um residente de Shankill, reduto protestante, acrescentou: “Não importa de onde viemos, queremos nossas ruas de volta. Isso não é sobre religião, é sobre sobrevivência.” A unidade foi ecoada por figuras públicas, com um ex-membro do DUP (Partido Unionista Democrático) afirmando que “o fiasco das autoridades em Londres e Stormont ficou impossível de ignorar”.
A manifestação ocorre em um momento delicado para a Irlanda do Norte, que ainda lida com as sequelas do Brexit e as tensões entre unionistas, favoráveis à permanência no Reino Unido, e nacionalistas, que buscam a reunificação com a Irlanda. O acordo de paz de 1998, conhecido como Good Friday Agreement, trouxe estabilidade, mas deixou cicatrizes profundas, com mais de 90 “muros da paz” ainda separando bairros católicos e protestantes em Belfast, segundo o Departamento de Justiça da Irlanda do Norte. Que essas barreiras simbólicas tenham sido superadas, mesmo que temporariamente, para um objetivo comum, reforça a gravidade do descontentamento.
Ver no Threads