A Polícia Federal (PF) revelou um esquema sofisticado de corrupção envolvendo agentes da Receita Federal em portos e aeroportos brasileiros, utilizado pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) para exportar cocaína para a Europa. A descoberta, tornada pública em 24 de março de 2025, baseia-se em trocas de mensagens interceptadas que apontam a colaboração de servidores públicos com a facção criminosa, facilitando o envio de grandes carregamentos de drogas a partir de terminais estratégicos no Brasil.
As investigações mostram que o PCC contava com uma rede de apoio dentro da própria Receita Federal, cujos agentes, supostamente corrompidos, ajudavam a burlar fiscalizações rigorosas em pontos como o Porto de Paranaguá, no Paraná, e o Aeroporto Internacional de Boa Vista, em Roraima. Uma apreensão de 322 kg de cocaína escondidos em uma carga de cerâmica, em 2020, no porto paranaense, foi o ponto de partida para desvendar o esquema. Mensagens trocadas entre Willian Barile Agati, conhecido como Senna e apontado como “concierge do PCC”, e seus comparsas indicam que agentes da Receita acessavam sistemas internos para verificar detalhes de apreensões e garantir a passagem de cargas ilícitas. Em uma das conversas, Senna relata: “Eu estou aqui com o pessoal da Receita. Eles estão puxando no sistema.”
O método preferido da facção para o transporte marítimo, conhecido como rip-on/rip-off, consistia em ocultar a droga em carregamentos lícitos, como cerâmica ou madeira, sem o conhecimento dos exportadores legítimos. Já no transporte aéreo, aviões particulares, como um jatinho pertencente a Senna, eram usados para levar cocaína até a Bélgica, de onde seguia por via terrestre para países como a Inglaterra. Werner Pereira da Rocha, administrador do aeroporto de Boa Vista, é acusado de facilitar essas operações, recebendo R$ 250 mil por viagem, enquanto um agente da Receita cobrava até R$ 500 mil por “vista grossa” nas fiscalizações.
A PF estima que o PCC tenha movimentado toneladas de cocaína nos últimos anos, aproveitando a infraestrutura de portos como Santos e Paranaguá, além de aeroportos menores, para alcançar o lucrativo mercado europeu. Em 2020, a Receita Federal apreendeu quase 5,9 toneladas de cocaína em Paranaguá, um indicativo da escala do tráfico na região. A corrupção de servidores públicos, incluindo um “planner” do Porto de Paranaguá que fornecia informações privilegiadas sobre a logística dos contêineres, foi essencial para o sucesso das operações.
A Receita Federal informou que a carga de 2020 foi detectada com o uso de escâneres, mas não comentou diretamente as acusações de corrupção entre seus agentes, mantendo o caso em aberto para esclarecimentos futuros. Enquanto isso, a defesa de Senna, atualmente preso em Brasília, nega seu envolvimento com o PCC, classificando-o como “presumido inocente”. As investigações continuam, com foco em desmantelar a rede de apoio interno que permitiu à facção operar com tamanha ousadia.